Artigo – Reflexões sobre a venda das refinarias da Petrobras com destaque para a Refinaria Landulpho Alves, em São Francisco do Conde, na Bahia
outubro 28, 2020 | Categoria: Notícia
Como todos sabem, pois não é segredo, o atual presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, revelou em entrevista, o sonho de privatizar a Petrobras. Já o ministro da economia do governo Bolsonaro, senhor Paulo Guedes, foi além e declarou que por ele vendia todas as empresas estatais do Brasil, logo, o desejo de “vender” a qualquer custo as refinarias da Petrobras, que é um patrimônio do povo brasileiro, existe e nós sabemos disso.
Na tentativa de ver esse desejo realizado, a gestão da Petrobras adota a tática da intimidação com os seus funcionários e com a sociedade brasileira tentando criar um clima de aceitação, como se o processo de venda já fosse algo irreversível, isso fica visível nas inúmeras declarações públicas do presidente da companhia, sempre afirmando que, em curto prazo, a venda estará concretizada. Mas não é só isso, várias reuniões são realizadas com os gestores locais para afirmar essas colocações, o que acaba chegando à força de trabalho e criando um clima de tensão e preocupação que vem tirando, de forma irresponsável, a tranquilidade dos trabalhadores e trabalhadoras, como se não bastasse a instabilidade política do Brasil, a crise econômica mundial e a pandemia da Covid-19 que assola o mundo e é potencializada pelas ações do governo anti-povo que temos no Brasil.
O resultado disso é que muitos trabalhadores e trabalhadoras estão ansiosos, entrando no botão automático, desesperançados. Alertas graves e importantes têm sido dados, como acidentes, até atos extremos contra a vida dentro e fora das instalações da empresa já ocorreram com ativos e aposentados que nutrem um carinho enorme por essa grande empresa que é a Petrobras.
De concreto, ainda, só o desejo de privatizar
Mas o que temos de concreto? Como foi dito anteriormente, nós temos o desejo do governo e da alta gestão da empresa em realizar a “venda” dos ativos da Petrobras e nisso as refinarias estão no bolo, mas não é só o desejo, algumas “vendas” já foram feitas. Em relação ás refinarias, das oito colocadas à venda, até o momento, só houve oferta para a compra da RLAM. Portanto, algumas ações entre as partes estão em andamento como a formação de equipes para a passagem de informações mais específicas, processo natural que ocorre nessa fase da negociação. Contudo, isso não significa que o martelo já foi batido, tanto que a assinatura do contrato ainda não ocorreu e tem sido sistematicamente adiada desde o anúncio da oferta pelo fundo de investimento Árabe, Mubadala, em 25 de junho desse ano.
Os gestores sempre colocaram o prazo de 60 dias para a assinatura do contrato, sendo assim, a assinatura deveria ter ocorrido em agosto, o que não se realizou. Já expirado esse prazo, voltaram a falar que até o final desse ano estariam assinando o contrato e, mais uma vez, isso não se realizou e agora falam que a assinatura pode ocorrer em janeiro. Assim, vemos nitidamente uma vontade muito grande por parte da gestão e do governo em finalizar essa negociação, mas as condições práticas ainda não estão dadas, e o que fica é essa pressão e clima pesado na força de trabalho dentro da refinaria.
Pois bem, a venda de um ativo como a Refinaria Landulpho Alves não é coisa fácil de se concretizar por inúmeros fatores e nós vamos aqui falar sobre eles. Um deles diz respeito à Reclamação Constitucional 42576, feita pelas mesas do Congresso Nacional, do Senado Federal e da Câmara dos deputados. Essa reclamação teve o seu pedido de liminar para a suspensão das vendas das refinarias julgado pelos ministros do STF e indeferido. No entendimento e na argumentação defendida, em seus votos, por seis ministros, a alegação que a gestão da Petrobras estaria criando subsidiárias no intuito de privatizar a Petrobras sem o aval do congresso não procedia, haja vista que o percentual envolvido nessa negociação correspondia apenas a 3% da Petrobras. Bom, esse foi o entendimento dos Ministros, o que acarretou a negação do pedido de liminar para interrupção das negociações.
O jogo não acabou
Mas isso não significa o fim de linha dessa questão, o mérito ainda será julgado e o voto do relator foi muito consistente em defesa da lei, em defesa da Constituição. “Dessa forma, entendo não ser possível a livre criação de subsidiárias com o consequente repasse de ativos e posterior venda direta no mercado. Como trouxe a peça inaugural desta ação “A falta de critérios balizadores quanto à liberdade de conformação empresarial em relação às subsidiárias abre espaço para um cenário de fraude, resultando em um esvaziamento do papel congressual na deliberação sobre os bens de domínio da União” (eDoc 1, p. 11). Zelar pelos bens pertencentes à União e a disponibilidade destes é atribuição do Congresso Nacional, sendo obrigatória sua participação para sustar atos que exorbitem o poder regulamentar do Poder Executivo, nos termos dos arts. 48 e 49 da Constituição. Se o refino do petróleo é monopólio da União (art. 177, II), ainda que este possa ser exercido por terceiros (art. 177, §1º), que não necessariamente a Petrobrás (art. 53 da Lei n.º 9.478), a importância da atividade ensejou a preocupação constitucional com o devido processo legal na disciplina quanto ao seu regime. E o arranjo institucional da Constituição demanda, afinal, a independência e harmonia entre os Poderes (art. 2º), que se faz por meio dos seus freios e contrapesos:”.
O voto reafirma o monopólio do refino sendo da união e no caso da venda de algumas refinarias do Brasil já temos estudos mostrando a existência de monopólios regionais (estudo produzido pela PUC do Rio de Janeiro) como no caso específico da RLAM, onde estaríamos, caso a venda seja concretizada, abrindo mão do monopólio da União e passando a ter um monopólio privado, algo que fere a Constituição.
Contudo, não é só a insegurança jurídica que pode atrapalhar – e já deve estar atrasando os planos do governo Bolsonaro que tem presa em concretizar a venda da RLAM como balão de ensaio para a venda de outras refinarias -,temos também as incertezas econômicas que se expressam de várias formas. Uma delas é a gestão temerária da alta gestão da Petrobras, que vem alienando os ativos da Petrobras a valores suspeitos, o que pode e deve em outro governo ser contestado. Alguns políticos influentes como Roberto Requião e o próprio Lula têm dito isso, o que traz insegurança para a negociação.
No caso da RLAM, a gestão não revelou o valor da oferta da Mubadala, mas em algumas publicações de veículos da imprensa especializada a gestão da Petrobras já admitiu que entre o valor esperado pela venda das refinarias e o valor que possivelmente se consiga, caso as vendas se concretizem, deve haver uma perda de 30%, o que aumenta nossas suspeitas que o valor ofertado pela segunda maior refinaria do Brasil em capacidade instalada e em complexidade, (que exerce um monopólio regional com isso estaríamos vendendo também um mercado), é um valor muito aquém do que ela vale.
Mas, além disso, tem as inseguranças econômicas do mundo e do Brasil, no caso do Brasil pior ainda, pois o governo não toma as ações necessárias e a economia brasileira não tem dado sinais de recuperação e mesmo nas previsões mais otimistas as projeções é que se ocorrer algum sinal de recuperação ele não será sustentado.
O que nós estamos assistindo é uma fuga de capitais internacionais do Brasil pela falta de confiança nesse governo, assim quem investe quer retorno e em um cenário de uma economia cambaleante o retorno não é certo. Uma outra forma do governo manter as condições do retorno para os interessados no negócio seria a manutenção de preços elevados ao consumidor final, mas aí existe outra questão que é a popularidade de um governo que irá buscar a reeleição. Com isso o que presenciamos é uma retração do preço dos combustíveis nas bombas, antes, no início da Pandemia, os valores chegaram perto de R$ 5 reais e hoje são praticados em torno de R$ 4 reais.
Dessa forma, as incertezas econômicas podem e devem também influenciar na concretização do negócio, já que quem investe em um ativo de alto custo como a RLAM, que mesmo tendo seu valor depreciado ainda tem os custos de manutenção que devem ser assumidos no ato da concretização da venda, quer retorno garantido e rápido, como é de praxe e já conhecemos a ganância desse pessoal quando investe no Brasil.
Resistência e paciência
Enquanto isso, os funcionários vão vivendo esse clima de incertezas e as ações irresponsáveis da gestão, que no afã de apresentar números reduzidos aos interessados, desestimulou os funcionários e incentivou a saída para outros ativos da Petrobras e a assinatura dos planos de desligamento (os PDV’s) que não atingiram apenas os funcionários com tempo e idade para se aposentarem. Com o clima ruim, muitos que poderiam permanecer ainda contribuindo com a empresa por alguns anos, devido as grandes pressões existentes e a sensação de insegurança, estão se submetendo a elevadas perdas e se inscrevendo nos planos de desligamento. Para esses, uma opinião, já fruto de conversas com outros companheiros: é preciso ter cautela e refletir, pois, em termos financeiros as perdas são muito grandes, com impactos pessoais e coletivos no plano de previdência (Petros). O benefício ofertado é praticamente o direito rescisório. Se contarmos, então, a garantia de emprego dada pelo nosso Acordo Coletivo de Trabalho até 31 de agosto de 2022 é ai que não vale a pena mesmo.
Se ainda houver dúvida sobre o atraso da venda e a ameaça de uma transferência for algo que incomode muito é só observar o próprio movimento da empresa (RLAM), que vem incentivando, nesses últimos dias, o pessoal da manutenção a desapertar o botão (PDV) e a grande preocupação da gestão de pessoas da operação, como muitos sabem, nas mesmas reuniões ocorridas nesse mês, onde é dito que o contrato de venda da RLAM pode ser assinado em janeiro. Há uma previsão que até o meio do ano de 2021 a operação da planta é exclusiva da Petrobras e depois seriam mais 18 meses de passagem de serviço, o que daria praticamente os dois anos garantidos pelo nosso Acordo Coletivo, só que até lá muita água pode rolar por baixo dessa ponte e o cenário mudar a favor da nossa resistência.
Temos hoje a influência do processo eleitoral desse ano e em 2022 teremos a influência das eleições para presidência da República, então, companheiros e companheiras, vamos para frente porque a caminhada continua e precisamos de todos para vencermos essas dificuldades e incertezas colocadas para nós trabalhadores e trabalhadoras da Refinaria Landulpho Alves e demais refinarias.
Escrito por Attila Barbosa – Diretor do Sindipetro Bahia e funcionário da Rlam
Tag: artigo, privatização, RLAM, venda das refinarias