Ouro de tolling: a Petrobras não deve nada à Unigel
agosto 14, 2023 | Categoria: Banner Principal, Notícia
Em dois anos a UNIGEL lucrou o equivalente a 180 anos de arrendamento
Por Jailton Andrade
No Brasil antes do golpe contra a presidenta Dilma Roussef, existia um princípio muito importante. Nele se dizia que o risco do negócio era do empreendedor.
Aí veio o golpe, com Temer veio o Programa de Parcerias e Investimentos, Ives Gandra, filho do líder militante “Fora Lula”, que disse em 2006 que a tributação (das empresas) levaria o país à falência, reescreveu as leis trabalhistas, depois veio o teto de gasto público… Tudo para “permitir a entrada de novos players”, como disse o ex-presidente da Petrobras e Roberto de Cunha Castello Branco, afinal o empresário estava sufocado com tanto povo e estado na folha de pagamento. A mão invisível segurando a chibata gozava sofrendo por ter que dividir a felicidade.
Mas o capitalista mostrou sua cara de solidário e quis repartir…. o risco. Mas e a legislação?
Durante o governo das trevas e do loteamento do setor público, os “players” se espalharam no Brasil viciados e fortalecidos no racismo, na humilhação e na ganância. Os emiradenses, que compraram a RLAM com 50% de desconto e ainda levaram a malha dutoviária de brinde, agora dizem que faltou a garantia de lucro pra sempre. Ora, eles compraram uma refinaria e não o risco! Essas palavras ficaram marcadas na cara do presidente do Brasil e do governador da Bahia depois do tapa duplo dado pelo Mohamad Bin Zayed, presidente da Mubadala e pelo lobista do agro e presidente da ACELEN, Luiz de Mendonça: Se não tiver petróleo barato cancelam a promessa de investimento de R$12 bi na Bahia. Diria Raul: é bandeira demais, meu Deus!
Pior que isso foi a audácia de Henry Slezynger com seu Grupo Unigel. Colocou Roberto Fiamengi infiltrado no Grupo de Trabalho criado pelo governo da Bahia que tinha o objetivo de estudar uma solução para a FAFEN e lá coletou todas as informações necessárias para confirmar que Jorge Celestino, diretor da Petrobras na época, estava mentindo para a opinião pública quando dizia que as Fafens davam prejuízo. Em 12 de novembro de 2019 Henry assina contrato de arrendamento das duas fábricas, juntamente com Wilson Macedo, então gerente geral da FAFEN BA. Com o arrendamento, a Unigel passa a pagar um aluguel de R$ 1,475 milhão por mês à Petrobras para ter as duas únicas fábricas de fertilizantes no norte-nordeste. Mas ninguém tem pressa, nem o mercado de fertilizante, nem os clientes do polo petroquímico de Camaçari. Só em maio de 2021 inicia-se a produção da FAFEN-SE e em novembro, dois anos depois do arrendamento, inicia a operação na FAFEN-BA. Segundo a própria Unigel, em 2020 o Brasil importou 1,15 milhão de toneladas de ureia a mais justamente porque as fábricas sob sua responsabilidade estavam paradas (Leia aqui). Mas como os ventos da caridade mudam, agora Unigel tem pressa de salvar o Brasil plantador e pra isso precisa de gás barato, se possível, de graça.
Com essa operação parcial em 2021, a Unigel, que teve um lucro operacional médio de R$ 300 milhões em 2019 e 2020, passou a lucrar R$ 1,49 bilhão em 2021 e R$ 1,7 bilhão em 2022, dados da própria Unigel. Se Sergio Caetano Leite, o diretor financeiro da Petrobras, fizer uma conta simples vai perceber que, considerando o arrendamento da Fafens no valor de R$177 milhões em 10 anos, o lucro operacional da Unigel em dois anos equivaleu a 180 anos de arrendamento! Que sofrimento, né?
Tanto que no Relatório da Administração que fez o balanço de 2022, a empresa começa logo dizendo: “Em 2022, a Unigel atingiu resultados recordes em quase 60 anos de história” e o relatório dedica essa fartura à “consolidação do novo segmento Agro”.
Agora me diga, o que é que a Petrobrás deve à Unigel? Que cegueira foi essa na estatal para acreditar no que o Grupo Unigel plantou na imprensa, sobre recuperação judicial, demissão em massa, desabastecimento de fertilizante? Porque não houve comoção nos dois anos em que a FAFEN-BA ficou parada?
Essa história de que a Unigel está sofrendo das pernas por causa do gás natural da Petrobrás é estelionato intelectual. O movimento sindical petroleiro sabe muito bem como se deu o lobby na tramitação da Lei do gás e a privatização da malha dutoviária de gás para reduzir o risco da indústria.
Se o caro leitor desta singela coluna abrir o demonstrativo financeiro da Unigel de 2020 (tome aí) vai ler na página 8 que a Unigel tinha uma expectativa com a “iminente abertura do mercado brasileiro de gás” com a aprovação do PL do gás. Segundo ela, “o projeto deve atrair novos investidores para ampliar a oferta de gás no país”. Ora! As expressões “iminente abertura” e “deve atrair” dizem exatamente que o Grupo Unigel assumiu um risco quando arrendou as fábricas mesmo antes da aprovação da lei. Agora a Petrobras assume esse risco? E o art. 2º da CLT que diz que o risco é do empreendedor fica como? Vamos fazer igual a Moro, não vem ao caso? E quem autoriza uma estatal a inverter o ônus nas relações comerciais brasileiras a prejuízo do estado?
Agora observe um detalhe interessante sobre a postura da Unigel diante da possível aprovação Lei do Gás no trecho destacado da página 9 do seu Relatório da Administração de 2020:
Assim, a ampliação da atuação da Unigel no setor de agro deve proporcionar o crescimento da companhia já no curto prazo, com uma expansão significativa de sua capacidade produtiva, com investimento reduzido, baixo risco de execução e trazendo diversificação de portifólio para um seguimento bastante resiliente da economia, a agricultura.
Foi exatamente isso que aconteceu. No afã de aumentar sua capacidade de produção diante da impressão de que o AGRO te daria rentabilidade estável, a empresa de Henry foi se endividando. Em 2019 a dívida líquida da Unigel era de R$ 1,4 bi e em 2022 fechou com R$ 2,4 bi. O problema é que Henry não entendeu direito quando Temer disse “tem que manter isso”…
No final das contas, o Grupo Unigel quer que a Petrobras pague a sua alavancagem e dizem que a saída pra isso é um tolling. Eu particularmente fiquei curioso pra saber quem foi o Raul Seixas da Petrobras que inventou o tolling, esse malabarismo jurídico inédito de transformar uma arrendatária, a Unigel, numa prestadora de serviço, fazendo com que todo o risco do negócio de fertilizante produzido por uma empresa privada passe para o estado brasileiro.
Mas a Petrobrás não tem nada a ver com a alavancagem ignorante da Unigel. Talvez, inclusive, tenha sido esse o motivo da renúncia inesperada do diretor de RI: a baderna.
Uma ultima demonstração de que a Petrobras estaria assumindo um prejuízo de terceiro sem ter dado causa é o fato de que o duto de gás natural que chega na fábrica arrendada pela Unigel é pressurizado por 30 fornecedores de gás, graças à lei que a Unigel, ABIQUIM, SINPEC e FIEB tanto pressionaram pra ser aprovada e que criou o tal “mercado livre” onde a Unigel compra mais de 90% do gás que consome.
Por tudo que foi dito, tanto a boa fé da Unigel quanto a boa vontade da Petrobras não têm nenhum valor, assim como a pirita, o ouro dos tolos. Mas se o contrato de tolling for aplicado, o prejuízo para a Petrobras não será nenhum valor abestalhado.
É a Loteria da Babilônia de Raul: o que você não sabe por inteiro / É como ganhar dinheiro / Mas isso é fácil e você não vai parar…
AVISO: Este texto não reflete, necessariamente, o pensamento do Sindicado dos Petroleiros e Petroleiras do Estado da Bahia.