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Publicado: 27/03/2019 | 2622 visualizações

STF pode suspender privatizações da TAG, Araucária Nitrogenados e refinarias

O presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, disse recentemente que espera fechar ainda neste mês a venda de 90% da Transportadora Associada de Gás (TAG) – uma rede de gasodutos de 4.500 quilômetros. Porém, assim como outros processos de desinvestimentos da estatal, a privatização da TAG é muito questionada no setor e uma nova decisão judicial pode impedir a negociação do ativo nos próximos dias. O ex-engenheiro da Petrobrás, Paulo César Ribeiro Lima, revela que o Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu uma reclamação constitucional, feita em nome do Sindicato Unificado dos Petroleiros de São Paulo, questionando a privatização do ativo. A relatoria do caso está na responsabilidade do ministro Edson Fachin.

Lima deu o subsídio técnico para a elaboração da reclamação e explica que, de acordo com uma decisão cautelar emitida em 2018 pelo ministro Ricardo Lewandowski, também do STF, a Petrobrás está proibida de vender o controle acionário de subsidiárias sem licitação. “Se o ministro Fachin concordar que a Petrobrás está descumprindo a determinação do ministro Lewandowski, a venda da TAG será parada, bem como a das refinarias e da Araucária Nitrogenados (ANSA), porque todos esses casos tratam-se de privatização”, afirmou o engenheiro. Lima, que também foi consultor na Câmara dos Deputados e no Senado, calcula que a Petrobrás passará a ter uma despesa anual de R$ 4,59 bilhões se vender a malha de gasodutos.

Quais serão as consequências da venda da TAG?

A TAG é uma empresa extremamente rentável. A rentabilidade dela vem do fato de que a Petrobrás não gasta dinheiro com o transporte de gás. Isso porque a TAG é uma subsidiária integral operada pela Transpetro. No frigir dos ovos, o custo que a Petrobrás tem para transportar o gás é, na verdade, o custo da Transpetro. Ao vender a TAG, a Petrobrás será obrigada a pagar pelo serviço de transporte de gás. Eu calculei o valor presente líquido do pagamento que a Petrobrás teria que fazer à TAG depois da privatização da empresa. 

Qual seria esse valor e como foi feito este cálculo?

Eu cheguei ao valor de US$ 12,44 bilhões. Eu utilizei uma taxa de desconto de 8,83% ao ano, a mesma utilizada no contrato de cessão onerosa. É uma taxa de desconto alta.  Então, se a TAG for vendida a uma taxa de US$ 8 bilhões, será um preço bem abaixo desses US$ 12,44 bilhões, que é o valor presente líquido que eu calculei. Em suma: será um prejuízo financeiro. 

Existem também opiniões no mercado que contestam o fato da Petrobrás deter o monopólio do transporte de gás. Como avalia isso?
A Agência Nacional do Petróleo (ANP) sempre questionou o fato da Petrobrás produzir e transportar gás. A agência entendia que tinha era preciso desverticalizar, com outra empresa fazendo o transporte. Na minha opinião, essa visão da ANP é equivocada. Você não resolve o problema do monopólio do transporte fazendo a privatização. Quando há um monopólio natural, como no caso do transporte de gás, é preciso ter uma regulação. Não interessa se o gasoduto é da Petrobrás ou de outra empresa. A ANP precisa definir normas de livre de acesso, por exemplo. E isso seria definido por meio de regulação. 

Assim como a ANP pode obrigar a Petrobrás a transportar para outros, a agência poderia também obrigar o investidor privado [que comprar a TAG] a transportar para as demais empresas. O acesso ao transporte independe da empresa. Esse acesso, na verdade, depende da regulação. Na Noruega, existe uma regulamentação do transporte de gás. Independente se seja a Equinor ou qualquer outra empresa. Essa questão se resolve com regulação e não com privatização. 

Quais serão os gastos da Petrobrás após a venda da TAG?

A receita da TAG foi de R$ 4,59 bilhões em 2017. Então, basicamente, esse valor será a despesa da Petrobrás todos os anos. A partir deste número, adicionando uma vida útil dos gasodutos e os contratos, eu cheguei ao valor de US$ 12,44 bilhões citado anteriormente. 

Em 2016, a Petrobrás gastou R$ 6,286 bilhões [com a TAG]. Mas agora, ao fazer esse pagamento, não há problemas para a Petrobrás, porque a TAG é uma subsidiária integral. Ou seja, o que é dito como “despesa” é, na verdade, receita de sua subsidiária. 

Existe movimentos similares em outros países, com empresas de petróleo vendo ativos importantes?

Não. Todos estão preocupados com a Era do Petróleo. Então, todo o mundo está querendo diversificar. Uma das vantagens de transportar e vender o gás é que ele, quimicamente falando, gera muito menos CO2 na comparação com a gasolina ou o diesel. O gás é um pouco mais limpo do que outros combustíveis. Outra vantagem é que, ao utilizar o gás em uma termelétrica, você pode aproveitar o CO2 resultante para fazer reinjeção. 

As empresas, como as do Oriente Médio, estão preocupadas até com a parte química, petroquímica e refino. A Saudi Aramco, por exemplo, está querendo usar a receita do petróleo para entrar em energias renováveis. Enquanto isso, a China também está construindo muitas refinarias. A Statoil mudou seu nome para Equinor – tirou o “óleo” do seu nome. Ou seja, a ordem mundial é diversificar. Enquanto isso, a Petrobrás está indo na contramão de todo o mundo, focando em exploração e produção. 

Uma das justificativas usadas pela diretora da empresa é que a vocação da Petrobrás é a área de Exploração e Produção…

A Petrobrás não era uma empresa de Exploração e Produção. Eu fui engenheiro da Petrobrás por 17 anos. Quando eu entrei na empresa, na década de 1980, a Petrobrás era uma empresa de refino. E também de distribuição e petroquímica. O foco estava nas refinarias e não na exploração e produção. Até porque, realmente, a Bacia de Campos só foi descoberta na década 1980, e posteriormente houve a subida na produção. Então, desde 1954 até os anos 1980, a empresa era focada em refinarias. Agora, existe essa retórica de que a Petrobrás é uma empresa de Exploração e Produção. Mesmo durante a Ditadura, a Petrobrás era uma empresa de petroquímica, com muitas subsidiárias nessa área. 

A Petrobrás está querendo acabar junto com a Era do Petróleo, daqui a 30 ou 40 anos. Eu participei de um grupo da empresa que, na década de 1990, defendia que a companhia precisava ser uma empresa de energia. Mas agora, a direção da estatal quer defender que a Petrobrás deve focar em Exploração e Produção. Tecnicamente, a Petrobrás está fazendo uma loucura. Não tem nada a ver com ideologia. Ela está no caminho contrário das demais grandes empresas do setor. 

E do ponto de vista legal? A venda da TAG chegou a ser questionada na Justiça. Como o senhor avalia essa questão?

O ministro Lewandowski emitiu uma decisão cautelar, no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade 5624, que proibia a venda do controle acionário de empresas sem licitações. Porque a venda de controle acionário é, na verdade, uma privatização. Então, está muito claro que não pode vender a TAG sem que haja uma licitação.

A Petrobrás está negociando a TAG com base no Decreto 9188/17. Esse decreto regulamenta a dispensa de licitação, que é o artigo 19, inciso 18, da Lei 13.303/16. Além disso, existe o acórdão 442 do Tribunal de Contas da União (TCU), que diz é possível fazer as vendas sem licitação. 

A Lei 9491/1997 ainda está em vigor e ela diz que, para vender o controle acionário de uma empresa estatal, é preciso fazer uma licitação pública para contratar duas empresas de avaliação do ativo. Depois disso, a determinação é de realizar um leilão público na Bolsa de Valores. 

Existem novas contestações na Justiça contra a venda da TAG?
O escritório de advocacia Garcez fez a reclamação constitucional nº 33.292 junto ao STF. Ela foi feita para dizer à Corte que a Petrobrás está afrontando a decisão cautelar do ministro Lewandowski. Pedimos que essa reclamação fosse encaminhada ao próprio Lewandowski, mas outro processo foi aberto e um sorteio foi feito. Assim, o assunto caiu nas mãos do ministro Edison Fachin. Pedimos uma liminar, alegando que a Petrobrás está descumprindo a determinação cautelar do Supremo. 

Em que fase está esse processo?

O ministro Edison Fachin abriu prazo de 10 dias para pedir informações ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) – que também tinha liberado a venda da TAG – e à Petrobrás. Esse prazo deve estar vencendo nesta semana. A reclamação foi feita em nome do Sindicato Unificado dos Petroleiros de São Paulo. Eu dei subsídio técnico para o escritório Garcez. 

Se o ministro Fachin concordar que a Petrobrás está descumprindo a determinação do ministro Lewandowski, a venda da TAG será parada, bem como a das refinarias e da Araucária Nitrogenados (ANSA), porque todos esses casos tratam-se de privatização. Estamos aguardando uma decisão do ministro Fachin para, quem sabe, determinar a suspensão da venda. 

[Via Petronotícias]