Michel Temer vive um período de profundo descrédito com a população. De acordo com uma pesquisa do instituto Vox Populi, encomendada pela Central Única dos Trabalhadores e divulgada em primeira mão por CartaCapital, 78% dos brasileiros desejam que o Tribunal Superior Eleitoral casse o mandato do peemedebista pelas supostas irregularidades cometidas pela chapa Dilma-Temer em 2014. Não é tudo: nove em cada dez brasileiros desejam que o novo presidente seja escolhido por eleições diretas, e não pelo Parlamento, como previsto pela Constituição.
Com a implosão do sistema político pelas delações da Odebrecht, Vagner Freitas, presidente da CUT, diz não esperar do Legislativo qualquer solução. “A crise política só começará a ser debelada com novas eleições, e somente uma intensa mobilização popular, com os movimentos sociais e a população nas ruas, será capaz de antecipá-las”, afirma.
As centrais sindicais planejam, para o próximo dia 28, uma greve geral contra as reformas trabalhista e previdenciária de Temer. Desde o início do ano, o movimento sindical tem enfrentado dificuldade para garantir a adesão de trabalhadores de setores estratégicos da economia em um cenário de elevado desemprego. Agora Freitas se mostra confiante em uma megamobilização, impulsionada pelo próprio governo.
“Cada vez que Temer se manifesta pelas reformas que retiram direitos dos trabalhadores, ele aumenta as nossas chances de sucesso. A sociedade civil é absolutamente contrária a essas propostas”. Na entrevista a seguir, Freitas fala sobre a mobilização. E defende a inclusão da bandeira pelas “Diretas Já” nos atos previstos para 28 de abril.
CartaCapital: Diante do tsunami causado pelas delações da Odebrecht, dá para esperar uma saída para a crise política construída pelo Legislativo?
Vagner Freitas: Não acredito. Boa parte dos deputados e senadores que estão aí sabe que não será capaz de se reeleger em 2018, até pelos reflexos da Lava Jato. Muitos parlamentares parecem negociar o fim de suas carreiras. A crise política só começará a ser debelada com novas eleições, e somente uma intensa mobilização popular, com os movimentos sociais e a população nas ruas, será capaz de antecipá-las.
A exemplo do ocorrido nos anos 1980, a campanha pelas “Diretas Já” voltará com força. A pesquisa CUT/Vox Populi mostra claramente isso. Para 78% dos entrevistados, o Tribunal Superior Eleitoral deveria cassar o mandato de Michel Temer. E um total de 90% deseja que o novo presidente seja escolhido diretamente, e não pelo Parlamento. Por isso, estou otimista. Acredito que a implosão do sistema político brasileiro possa desaguar em uma reforma com mais participação popular, com mais democracia.
Nesse sentido, uma eleição indireta seria uma tragédia.
CC: Seria o caso de novas eleições apenas para a Presidência da República ou também para o Parlamento? Pergunto isso porque parcela significativa dos congressistas está envolvida até o pescoço nesse escândalo.
VF: Nossa proposta é convocar eleição geral, renovar tanto o Executivo quanto o Legislativo. Todo o sistema está corroído. Na verdade, precisamos de uma ampla reforma política. Convocar novas eleições pelas atuais regras é melhor do que uma escolha indireta, sem dúvida, mas precisamos aperfeiçoar a legislação para evitar a repetição dos mesmos vícios que têm contaminado as campanhas eleitorais.
CC: Por outro lado, parece temerário confiar a reforma política ao atual Parlamento, ou estou enganado?
VF: É temerário, sim. A emenda pode sair pior que o soneto, corremos o risco de herdar uma legislação pior. Novas eleições contribuíram, porém, para arejar o ambiente político e promover as mudanças necessárias. E há sinais de melhora do ambiente político para os setores progressistas. O movimento sindical cresceu muito nos últimos tempos, bem como a atuação dos movimentos sociais. O próprio ex-presidente Lula tem aumentado a sua projeção, a despeito da caça às bruxas contra ele. Nossa pesquisa revela que ele ganharia as eleições presidenciais tanto no primeiro quanto no segundo turno.
CC: As centrais sindicais e as frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo prometem uma greve geral para 28 de abril contra as reformas de Temer. Haverá, de fato, uma forte adesão dos trabalhadores ao movimento?
VF: Será a maior greve geral da história do Brasil, pode acreditar. Todos os sindicatos estão engajados no País inteiro. Cada vez que o Temer se manifesta pelas reformas que retiram direitos dos trabalhadores ele aumenta a chance de sucesso da nossa mobilização. Recentemente, em reunião com ministros e parlamentares da base, ele disse que a saída política é aprovar a reforma da Previdência. Seria uma forma de demonstrar que o seu governo não está paralisado diante da Lava Jato. No entanto, a população é absolutamente contrária à proposta.
Essa é uma pauta que mobiliza toda a sociedade civil, e temos fortes manifestações de oposição da CNBB, da OAB. Se insistir nessa agenda, Temer só aumentará a sua impopularidade. Os deputados e senadores que quiserem morrer abraçados com ele irão votar com o governo. Se ainda possuem algum sonho de voltar em 2018, pensarão duas vezes, como estão fazendo, segundo os relatos de rebeliões na base noticiadas até pelos jornais que apoiam o governo. A greve geral vai acontecer porque Temer está ajudando a mobilizá-la, com uma medida mais impopular que outra, que afeta todos os trabalhadores.
CC: Como a Força Sindical se posiciona nesse momento? Algumas lideranças, como o deputado Paulo Pereira, apoiaram a “solução Temer”...
VF: A Força vem para a greve. Independentemente das posições pessoais do presidente da central, eles estão convocando a sua base. E eu espero mesmo que estejamos juntos nessa luta, porque a sanha em retirar direitos dos trabalhadores nunca foi tão grande como nesse governo. A unidade de todas as centrais e movimentos sociais é fundamental.
CC: A Força também apoia a proposta de antecipação de eleições?
VF: Não. Eles estão juntos conosco nos quatro pontos da greve geral: não à reforma trabalhista, não à reforma previdenciária, não à terceirização e nenhum direito a menos. Não se envolveram na pauta das Diretas Já.
CC: E os movimentos sociais? Estão alinhados com essa proposta?
VF: Diretas Já é uma pauta consensual nas frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, nenhum movimento se opõe. Alguns defendem, além de novas eleições, a proposta de um plebiscito para a reforma política. Outros acham que não é o melhor momento. Há divergências de opinião, mas não uma divisão. Dentro do movimento sindical é que não há unidade em torno dessa pauta de antecipação de eleições. A Força e UGT, por exemplo, preferem não entrar nesse debate.
CC: Os parlamentares de partidos de esquerda estariam dispostos a abreviar seus mandatos por novas eleições?
VF: Acredito que sim, porque eles são muito influenciados por sua base social, que hoje está reunida nas frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo.
CC: Antecipar eleições é o suficiente para dar fim à crise política?
VF: Não diria isso, mas é uma etapa necessária. O Brasil não sairá da crise sem passar por uma eleição direta, entendida como um divisor de águas. É como Lula tem dito, precisamos retomar o caminho da democracia. Sem isso, não há chance de superar a crise política, que aprofunda a crise econômica e social. A única chance de o País se reerguer é eleger um governo com a legitimidade do voto, para que a agenda política não seja sequestrada pelos interesses de meia dúzia.
A eleição direta é o primeiro e essencial passo. Depois, vem o desafio de eleger um governo realmente comprometido com os trabalhadores. E manter a mobilização para que esse governo coloque em prática a agenda prometida à população, que não enverede por outra negociada com setores conservadores. O Brasil precisa retomar o caminho da democracia para que a sociedade volte a participar dos destinos políticos.
Fonte: FUP