Digite no Google o nome das empresas estrangeiras convidadas pela Petrobras para disputar a licitação de sua maior obra nos próximos anos – a construção da Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN), que vai receber o gás natural produzido a partir de 2020 no pré-sal da Bacia de Santos.
Acrescente na barra de pesquisa a palavra corruption e virão na tela links com denúncias de pagamento de propina, superfaturamento e sonegação envolvendo essas empresas em canteiros de obra ao redor do mundo, muitos instalados em campos de exploração de petróleo.
A lista é por ordem alfabética. No topo da relação, está a empresa Acciona, da Espanha, acusada por uma empresa alemã por fraude na aquisição de uma estatal de gás natural.
A número 2, a inglesa Amec Foster Wheeler, foi acusada pelo Comitê de Proteção do Petróleo do Azerbaijão, onde atua desde maio de 2001, de operar “com violações da lei”. A acusação principal é a de não respeitar regras trabalhistas no país e sonegar impostos.
A número 3, a Areva, da França, foi alvo de um processo movido pela ONG anticorrupção Sherpa por pagamento de propina em negócios de mineração na África do Sul, Namíbia e República Centro-Africana.
Em dezembro de 2014, segundo nota publicada no site do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, a empresa norte-americana Bechtel Corporation, a quarta por ordem alfabética da lista da Petrobras, se declarou culpada num processo por corrupção.
O então vice-presidente foi condenado a 42 meses de prisão, por ter pago 5,2 milhões de dólares em propinas para manipular o processo de licitação para contratos de energia com uma estatal do Egito.
Depois da condenação, o procurador de Justiça Leslie R. Caldwell, da Divisão Criminal do Departamento de Justiça, disse: “A corrupção externa é um flagelo internacional, e vamos perseguir aqueles que aceitam subornos, sejam eles funcionários do governo ou altos executivos corporativos. Toda condenação por corrupção é um passo rumo à erradicação e dissuasão deste problema global”.
Mesmo com a condenação de um dos mais importantes executivos, a empresa Bechtel Corporation continuou operando nos Estados Unidos e ao redor do mundo e é por isso que participará da disputa desse contrato da Petrobras, que pode chegar a 1,5 bilhões de reais.
Como mostra o episódio, os americanos, ao contrário dos juízes, procuradores e promotores brasileiros, protegem suas empresas. Prendem corruptos, não acabam com as empresas.
A quinta da lista da Petrobras é outra empresa americana, a Chicago Bridge & Iron Company, apresentado pelo jornal El Espectador, da Colômbia, como o principal elemento no olho da tempestade em que se transformou um contrato com a Reficar, a segunda maior refinaria de petróleo do país, localizada próxima à cidade costeira de Cartagena.
“A empresa (a colombiana Reficar) descobriu recentemente excesso de gastos e operações questionáveis”, destacou o jornal. A mesma empresa americana, a Chicago Bridge, se viu envolvida em outro escândalo na Colômbia, desta vez com a Ecopetrol, a maior empresa de petróleo do país, contratada a preços considerados excessivos para serviços em que não tinha experiência.
A sexta empresa na lista da Petrobras é a chinesa subsidiária da Chalco, estatal de alumínio daquele país. Recentemente, o principal executivo da Chalco renunciou depois de ter o nome envolvido em um caso de corrupção na própria China.
A lista segue. Nenhuma busca no Google de nome da empresa acompanhada da palavra corrupção vem sem resultado. Até a alemã ThyssenKrupp, que havia adotado rigorosos sistemas de controle anticorrupção em 2011, se viu recentemente alvo de uma investigação pela suspeita de subornar autoridades turcas.
Para o diretor da Associação dos Engenheiros da Petrobras (AEPET), Herbert Teixeira, a substituição de empresas nacionais por estrangeiras nas grandes obras “obedece a um padrão recente de entrega das riquezas e serviços da empresa”.
E não protege a estatal da corrupção, como mostra o levantamento das empresas que a Petrobras quer trazer ao país.
Negócios envolvendo petróleo registram o maior número de casos envolvendo corrupção no mundo.
De acordo com um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que analisou 427 casos de suborno em negócios internacionais, as empresas de extração mineral concentram 19% dos casos comprovados de corrupção. Está no topo do ranking, à frente do setor da construção, transporte e comunicação.
Em entrevista ao DCM, Herbert disse que, se quisesse mesmo enfrentar a corrupção, a Petrobras mudaria o modelo de contratação das empresas e não apenas nacionalidade dos fornecedores.
“A Lava Jato mostrou que a corrupção era facilitada pela forma como a Petrobras contratava, no sistema EPC. E esse modelo continua intacto, assim como os dirigentes da empresa abaixo do novo presidente”, disse.
EPC é a sigla em inglês para Engineering, Procurement e Construction, que significa Engenharia, Aquisição e Construção. Ao contratar por esse modelo, a empresa transfere à contratada a responsabilidade por todo o projeto de engenharia, pela compra de material e pela obra completa.
“Só as grandes empresas, apoiadas por bancos, têm condição de assumir um contrato como este”, afirma.
A Associação dos Engenheiros foi criada em 1961, quando vozes conservadoras ainda gritavam contra o que seria desperdício de dinheiro público manter a Petrobras. “Por que, se podemos comprar gasolina barata da Texaco ou do Esso, sem gastar o dinheiro dos impostos?”, questionava, por exemplo, o economista Roberto Campos.
Assim como, 56 anos atrás, os engenheiros da Petrobras se organizaram para manter a campanha O Petróleo É Nosso, a Associação continua ativa hoje, com o trabalho voluntário (não remunerado) de seus diretores.
Antes da Petrobras divulgar a relação das empresas estrangeiras convidadas para atuar no Brasil, a Associação enviou carta à direção da estatal, sugerindo a mudança do modelo de contratação. “Não defendemos empresas corruptas ou cartéis, mas queremos extrair a raiz do problema”, observa.
Para ele, a Petrobras precisa se manter no controle do processo, contratando por itens, o que pode ser feito até pela internet, de forma transparente.
“Primeiro se cria o projeto básico de engenharia, relaciona o material e o serviço necessários, abre licitação e realiza as compras. Assim você pode saber, por exemplo, quantos tubos irá precisar e quantas soldas necessitará. Com certeza, reduz o custo e diminui o risco de cartelização”, afirma.
A Petrobras trabalhava dessa forma (contratando por itens) entre as décadas de 70 e início da década de 80. “Foi nesse sistema que construímos várias refinarias no Brasil, como a de Paulínia e a do Rio Grande do Sul”.
Na década de 90, a partir do governo Collor, o sistema de contratação mudou e só houve espaço para grandes empresas. Até o início dos anos 2000, em geral as estrangeiras ficavam com os principais contratos.
No início da década passada, ainda no governo de Fernando Henrique Cardoso, houve o início dos incentivos para conteúdo nacional. “Foi uma medida para enfrentar o desemprego, muito alto na época, e a Petrobras sempre foi indutora de empregos no Brasil”, afirma.
Na relação cada vez mais estreita com a estatal, as empresas nacionais cresceram e formaram cartéis, como admitiram agora na operação Lava Jato.
“O que estamos vendo agora é o risco de continuidade dos cartéis, só que nas mãos de estrangeiros. Quando for contratada a empresa que vai assumir este contrato bilionário, o emprego que seria gerado aqui será gerado no Japão, Estados Unidos ou China, dependendo de quem ganhar. Por isso é que nós da AEPET defendemos que o modelo permita a participação de empresas médias e pequenas. É possível, mas precisa ser uma opção política”, afirma.
Mas, para ele, com a atual direção da Petrobras, é muito difícil. “Nada mudou na empresa, exceto os diretores apanhados em flagrante”, acrescenta.
“Quem é o atual diretor da Produção e Tecnologia? Roberto Moro (por coincidência, tem o mesmo sobrenome que o juiz da Lava Jato). E quem Roberto Moro era antes? Ocupava uma das gerências nas diretorias de Renato Duque (preso por corrupção). Quem é o atual diretor de Refino e Gás Natural? Jorge Celestino Ramos. E que cargo ele ocupava antes? Gerente executivo na diretoria de Paulo Roberto Costa (que também foi preso).
“O pessoal que participou decisivamente da criação do ambiente que favoreceu a corrupção continua lá. Por isso, é que o modelo de contratação não mudou. Só estão mudando o cartel de empresas”, afirma Herbert Teixeira.
No Brasil, quem foi escolhido no governo Temer para ser maestro dessa orquestra altamente suscetível a desvios?
Pedro Parente, que foi presidente do Conselho de Administração da Petrobras, em 2001, no governo de Fernando Henrique Cardoso, quando foi feito um dos piores negócios da história da empresa.
A Petrobras comprou a petroleira argentina Perez Companc, controlada pela espanhola Repsol, a preço superfaturado, que teria provocado prejuízo de R$ 790 milhões à época (2,4 bilhões em valores corrigidos).
Desde 2001, Pedro Parente é réu em ação popular por conta desta compra escandalosa, que na época provocou queda expressiva no preço das ações da Petrobras, mas até ainda não houve julgamento.
Recentemente, o ex-diretor da empresa Nestor Cerveró, em delação premiada ao juiz Sérgio Moro, disse que esse negócio gerou o pagamento de propina no valor de 100 milhões de dólares a integrantes do governo de Fernando Henrique Cardoso.
Esse item da delação não teve nenhum efeito prático na Vara do juiz Sérgio Moro, e Pedro Parente pode assumir a presidência da empresa, assinando agora contratos que entregam reservas de pré-sal a petroleiras de outros países a preço de banana, segundo a AEPEC, e favorecendo empresas estrangeiras no contrato de obras e serviços.
“E eles estão fazendo tudo isso muito depressa. Começou no dia seguinte à autorização do impeachment. Estão comprometendo o futuro deste País”, desabava o engenheiro. “Mais do que nunca, precisamos retomar a bandeira: O Petróleo É Nosso.”
Fonte: FUP